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Reformatando o futuro hoje

Paulo Hartung (*)

O Brasil vem se tornando o epicentro do coronavírus no mundo. É um momento dramático para o País, com milhares de vidas humanas sendo perdidas, desemprego avançando e brasileiros desamparados. Chama a atenção que neste cenário ainda haja espaço para debates vazios. Passou da hora de o Brasil concentrar forças na travessia dessa tormenta.

A Alemanha tem sido um bom exemplo de gestão da crise. A chanceler Angela Merkel baseia-se na ciência e nas orientações de profissionais capacitados, coordena a pluralidade política para um sentido único de ações, mantendo a população orientada e protegida, na medida do possível. Houve humildade e entendimento do que é prioridade, chamando a oposição para conversar e buscando um caminho melhor para a nação.

O resultado é que, por ora, a crise de saúde naquele país está controlada. Sempre dispostos a darem um passo atrás, se necessário, eles começam gradativamente o processo de retomada da economia em todos os segmentos, mesmo os ditos não essenciais. Tudo com os devidos cuidados com a saúde, avaliando-se constantemente a evolução de novos casos da doença e mantendo o diálogo.

Na China, onde a pandemia teve início, mas que já está controlada, os cuidados para evitar o retorno da doença são significativos. No aeroporto, todos os passageiros que chegam ao país passam por aferição de temperatura e depois seguem para quarentena no hotel ou em casa. Só depois desse período, podem retomar a vida normalmente.

O ineditismo da situação atual exige disposição e aprendizado intenso de todos, cientistas, políticos, profissionais da saúde e cidadãos. No âmbito das empresas, é o caso de readaptar operações, cuidar ainda mais dos colaboradores e suas famílias, incrementar a conduta humanizada. 

Assim como a pandemia chegou antes em outros países, e o Brasil poderia ter aprendido um pouco com essas experiências, podemos nesta etapa fazer diferente e aproveitar para tirar lições da caminhada de quem já está uma etapa à frente, considerando seus erros e acertos.

O setor de árvores cultivadas é ligado diretamente à ciência, com milhões investidos em pesquisa e desenvolvimento, e talvez por isso soube ouvir atentamente o que a comunidade científica recomendou sobre cuidados contra a disseminação da doença. Vários protocolos foram adotados, e constantemente melhorados, para proteger os colaboradores que seguiram trabalhando e entregando à sociedade produtos indispensáveis ao cotidiano. 

Além desses cuidados internos, as empresas de base florestal demonstraram liderança ao rapidamente assumirem uma atuação ativa junto à sociedade e às comunidades próximas. Foram investidos mais de R$ 114 milhões em ações sociais, incluindo doações e parcerias para construção de hospitais de campanha, aquisição de respiradores e EPIs para os profissionais de saúde.

Além disso, com a parada econômica agravando a situação de quem já vivia perto das margens da pobreza, as empresas partiram para projetos que ajudassem a estruturar novas fontes de renda nas comunidades, como, por exemplo, a encomenda de 125,6 mil máscaras de tecido a costureiras e artesãos de mais de cinco Estados brasileiros.

As empresas também atuam para fortalecer vendas da agricultura familiar do entorno das unidades do setor, ajudando a estabelecer novos canais de comercialização, já que antes a produção era exclusivamente escoada nas feiras livres, suspensas em muitos municípios. Há, ainda, ações com foco na segurança alimentar das comunidades mais vulneráveis, com doação de alimentos e itens de higiene básica por quase todo o País.

Sim, o baque da pandemia escancarou problemas graves da sociabilidade atual, como a infame desigualdade socioeconômica, repercutindo inclusive no mundo das finanças. Segundo o CEO no Brasil da BlackRock, maior fundo de investimentos mundial, Carlos Takahashi, em publicação no Valor Econômico, as boas práticas empresariais, incluindo filantropia e atenção especial a colaboradores e clientes, ficaram mais evidentes neste período e devem passar a ser precificadas nos ativos.  De acordo com Takahashi, a construção de um mundo mais igualitário, transparente e sustentável deve estar na pauta de todos.

Cabe fazermos uma travessia desta crise de tal modo que saiamos em pé, e não de joelhos, e aptos a construir esse novo mundo. Além disso, é preciso constituir um novo normal, uma vez que a crise deixou patente que o passado não pode, nem merece ser repetido. 

Um dos caminhos é o olhar o sistêmico e humanístico sobre a vida e a produção, tendo vista a interdependência dos processos e a impositiva conjugação da atuação de cada um nós, seja como cidadãos, organizações produtivas,  instituições governamentais ou entidades não governamentais. 

Falando em mundo integrado, é preciso atenção especial à questão climática, que não respeita fronteira alguma, alcançado o planeta como um todo. A retomada tem de incluir critérios socioambientais na agenda das nações, sob o custo de comprometermos a vida das futuras gerações. 

Por exemplo, no seu plano de recuperação pós-pandemia, a União Europeia colocou a questão de sustentabilidade e de combate às mudanças climáticas como uma das prioridades. O plano de retomada fala em investimentos de € 750 bilhões. 

Essa orientação para a busca de um mundo mais humanizado, integrado, sustentável e colaborativo está incorporada no ideário das empresas do setor de árvores cultivadas, que historicamente têm uma postura já baseada no tripé da sustentabilidade, com preocupações sociais, ambientais e econômicas.

Se os debates e ações para a gestão da crise atual já não podem mais considerar economia, pessoas e meio ambiente de modo estanque, separadamente, que fique esta lição para organizar nossos passos adiante.

Clima, sustentabilidade econômica, redução da desigualdade social, entre outros, são temas de uma agenda planetária e comum a todos. E como o futuro é o que estamos fazendo hoje, não há mais tempo a perder, até porque a crise mesmo impôs a demanda e a oportunidade para a reinvenção do mundo. Mãos à obra. 

(*) Paulo Hartung é Economista, presidente-executivo Ibá (Indústria Brasileira de Árvores), membro do conselho do Todos Pela Educação, ex-governador do Estado do Espírito Santo (2003-2010/2015-2018)